A incorporação de enzimas em produtos de limpeza representa um dos avanços mais significativos na busca por formulações potentes, sustentáveis e com alta eficiência energética.
Contudo, assegurar que essas enzimas mantenham sua atividade e estabilidade durante o armazenamento e a utilização é um dos maiores desafios enfrentados por cientistas e formuladores.
As enzimas são proteínas com uma estrutura tridimensional complexa e intrinsecamente sensível, o que as torna suscetíveis à perda de função diante de variações de pH, temperatura, presença de íons metálicos específicos ou agentes oxidantes.
Neste artigo, exploraremos as principais estratégias empregadas para estabilizar enzimas em formulações tanto líquidas quanto sólidas, visando garantir a máxima eficiência de limpeza e uma vida útil prolongada do produto.
Cada enzima exibe uma faixa de pH ideal para sua atuação catalítica, que geralmente se situa entre 6,0 e 9,0, embora possa variar consideravelmente dependendo do tipo enzimático específico.
Fora dessa faixa de pH ótimo, as ligações de hidrogênio e as forças eletrostáticas que são responsáveis por manter a conformação tridimensional ativa da enzima podem ser severamente perturbadas, culminando em um processo de desnaturação e consequente perda de função.
✔️ Solução estratégica: Utilização de sistemas tamponantes eficazes
Um sistema tampão, também conhecido como “pH amortecido”, possui a capacidade de manter o pH de uma solução relativamente estável, mesmo quando pequenas quantidades de ácidos ou bases são adicionadas durante o uso do produto.
Diversos compostos químicos são amplamente empregados em detergentes enzimáticos para essa finalidade, incluindo:
– Bicarbonato de sódio (NaHCO₃) / carbonato de sódio (Na₂CO₃);
– Borato de sódio (borax);
– Fosfatos (como fosfato de sódio);
– Citratos (como citrato de sódio).
Esses compostos atuam estabilizando o microambiente que circunda a enzima, prevenindo alterações bruscas de pH que poderiam ser causadas pela dureza da água utilizada na diluição, por resíduos presentes nas superfícies a serem limpas ou por variações na própria formulação do produto ao longo do tempo.
📌 Exemplo Ilustrativo:
Proteases neutras, como a subtilisina, demonstram atividade catalítica ótima em uma faixa de pH entre 7,5 e 8,5.
A utilização de um tampão fosfato adequado pode manter o pH dentro dessa faixa ideal, mesmo após a diluição do produto concentrado com água da torneira, que pode apresentar variações em seu pH.
Íons metálicos divalentes, como o cálcio (Ca²⁺) e o magnésio (Mg²⁺), são frequentemente encontrados na água utilizada para diluição e podem estar presentes nas superfícies a serem limpas.
Em concentrações elevadas, alguns desses íons podem interagir com grupos funcionais específicos presentes na estrutura da enzima, promovendo alterações conformacionais indesejadas ou até mesmo a precipitação da proteína enzimática, resultando na perda de sua atividade.
✔️ Solução Estratégica: Adição de agentes quelantes eficientes
Agentes quelantes, como os seguintes compostos, possuem a capacidade de se ligar a íons metálicos livres em solução, formando complexos estáveis e, dessa forma, impedindo que esses íons interfiram na atividade catalítica da enzima ou formem sais insolúveis com outros componentes da formulação do produto:
– EDTA (ácido etilenodiamino tetra-acético);
– NTA (ácido nitrilotriacético);
– GLDA (ácido glutâmico diacético) – uma alternativa – biodegradável.
📌 Cuidado Importante:
É crucial notar que algumas enzimas dependem da presença de íons Ca²⁺ para a manutenção de sua estabilidade estrutural e atividade catalítica.
Nesses casos específicos, deve-se utilizar níveis cuidadosamente controlados de Ca²⁺, que podem estar ligados a outros componentes da formulação ou tamponados para garantir a estabilidade da enzima sem comprometer a formulação geral.
As enzimas, por serem proteínas, tornam-se um substrato nutritivo para diversos microrganismos em formulações aquosas.
A proliferação microbiana pode levar à produção de proteases naturais que degradam as enzimas intencionalmente adicionadas ao produto, além de causarem alterações visuais indesejáveis e o desenvolvimento de odores desagradáveis no produto final.
✔️ Solução estratégica: Utilização de sistemas conservantes compatíveis
É de suma importância selecionar conservantes que possuam eficácia antimicrobiana sem, contudo, inativar as enzimas presentes na formulação por mecanismos como oxidação direta ou modificação covalente de sítios importantes na estrutura enzimática.
Alguns exemplos de conservantes comumente utilizados em formulações enzimáticas incluem:
– Fenoxietanol;
– Benzisotiazolinona (BIT);
– Sódio benzoato (particularmente eficaz em formulações com pH ácido).
📌 Importante Consideração:
Deve-se evitar a utilização de conservantes com forte ação oxidante, como certos parabenos que podem gerar peróxidos, pois esses compostos podem reagir com resíduos de cisteína presentes em algumas enzimas, comprometendo sua atividade.
A presença de tensoativos é fundamental na composição de produtos de limpeza, pois eles auxiliam na remoção da sujeira das superfícies.
No entanto, muitos surfactantes aniônicos fortes, como o lauril sulfato de sódio (SLS), podem interagir negativamente com as enzimas, promovendo a desnaturação de sua estrutura proteica ou bloqueando o acesso do substrato ao sítio ativo da enzima.
✔️ Solução Estratégica: Escolha de co-surfactantes não iônicos ou anfóteros
A utilização de co-surfactantes suaves cria um ambiente mais favorável para a estabilidade das enzimas, além de facilitarem a solubilização da mancha e o contato eficiente do substrato com o sítio catalítico da enzima.
Exemplos de co-surfactantes comumente empregados incluem:
– Alquil poliglucosídeos (APGs);
– Betaínas (como a cocamidopropil betaína);
– Éteres de polietilenoglicol (PEG-8).
Esses ingredientes auxiliam na redução da tensão superficial da água e aumentam a bioacessibilidade da sujeira à ação enzimática, sem comprometer a integridade estrutural e a atividade das enzimas presentes na formulação.

A manutenção da atividade enzimática em formulações de limpeza demanda uma combinação precisa e sinérgica de estratégias que envolvem o controle rigoroso do pH, a remoção de íons metálicos que possam interferir na atividade enzimática, a implementação de sistemas de proteção antimicrobiana eficazes e a utilização de tensoativos que sejam compatíveis com a estrutura e a função das enzimas.
Quando essas estratégias físico-químicas e tecnológicas são aplicadas de maneira otimizada, torna-se possível desenvolver produtos de limpeza de alta performance, com estabilidade prolongada durante o armazenamento e o uso, um perfil de menor impacto ambiental e, crucialmente, resultados superiores na remoção de uma ampla gama de manchas.
Para embasar as informações apresentadas neste artigo e fornecer aos leitores referências confiáveis para aprofundamento no tema, foram consultadas as seguintes publicações científicas e obras de referência:
Dickinson, J. R. (2003). Enzymes in Detergents. Surfactant Science Series, Vol. 112. Marcel Dekker.
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Agentes Quelantes: Substâncias que se ligam a íons metálicos, inativando-os.
Agentes Oxidantes: Substâncias que promovem a oxidação.
Água Dura: Água com alta concentração de íons cálcio e magnésio.
Alquil Poliglucosídeos (APGs): Surfactantes não iônicos suaves.
Ambiente de Trabalho Organizado: Espaço de trabalho arrumado e eficiente.
Betaínas: Surfactantes anfóteros suaves.
Bicarbonato de Sódio (NaHCO₃): Sal alcalino usado como tampão.
Bioacessibilidade: Facilidade com que uma substância interage com um sistema biológico.
Borato de Sódio (Borax): Sal alcalino usado como tampão e agente de limpeza.
Ca²⁺: Íon cálcio.
Carbonato de Sódio (Na₂CO₃): Sal alcalino usado como tampão e agente de limpeza.
Citratos: Sais do ácido cítrico, usados como tamponantes e quelantes.
Cocamidopropil Betaína: Surfactante anfótero suave.
Complexos Estáveis: Ligações químicas fortes entre um íon metálico e um agente quelante.
Concentrações Elevadas: Grandes quantidades de uma substância.
Conservantes: Substâncias que impedem o crescimento de microrganismos.
Contaminação Microbiana: Presença e proliferação de microrganismos indesejados.
Controle Ácido-Base: Manutenção do pH em uma faixa ideal.
Co-Surfactantes: Surfactantes adicionais que auxiliam na ação do surfactante principal.
Co-Surfactantes Anfóteros: Surfactantes que podem ter carga positiva ou negativa dependendo do pH.
Co-Surfactantes Não Iônicos: Surfactantes sem carga elétrica.
Degradação Microbiana: Quebra de substâncias por microrganismos.
Desnaturação: Perda da estrutura tridimensional funcional de uma proteína (como uma enzima).
Detergente em Pó: Produto de limpeza sólido em forma de pó.
Detergente Líquido: Produto de limpeza em estado líquido.
Dureza da Água: Concentração de minerais, especialmente cálcio e magnésio, na água.
EDTA (Ácido Etilenodiamino Tetra-Acético): Agente quelante eficiente.
Eficácia Antimicrobiana: Capacidade de matar ou inibir o crescimento de microrganismos.
Éteres de Polietilenoglicol (PEG-8): Surfactantes não iônicos suaves.
Faixa de pH Ótimo: Intervalo de pH em que a enzima tem máxima atividade.
Fenoxietanol: Conservante comum em cosméticos e produtos de limpeza.
Forças Eletrostáticas: Forças de atração ou repulsão entre cargas elétricas.
Formulações Aquosas: Produtos que têm água como principal solvente.
Formulações Líquidas: Produtos em estado líquido.
Formulações Potentes: Produtos com alta capacidade de limpeza.
GLDA (Ácido Glutâmico Diacético): Agente quelante biodegradável.
Granuladas (Enzimas): Enzimas em forma de pequenos grânulos.
Hidrólise: Quebra de uma molécula pela adição de água.
Inativação: Perda da atividade catalítica de uma enzima.
Incorporação de Enzimas: Adição de enzimas a produtos de limpeza.
Íons Metálicos Divalentes: Íons com carga +2, como cálcio e magnésio.
Microambiente: Ambiente imediato ao redor da enzima.
Microemulsões: Misturas estáveis de óleo e água com partículas muito pequenas.
Modificação Covalente: Alteração da estrutura da enzima por formação de ligações químicas.
Níveis Cuidadosamente Controlados: Quantidades precisamente medidas.
NTA (Ácido Nitrilotriacético): Agente quelante.
Odores Desagradáveis: Cheiros ruins.
Oxidação Direta: Reação química com oxigênio que pode inativar enzimas.
Parabenos: Tipo de conservante, alguns dos quais podem gerar peróxidos.
Perfil de Menor Impacto Ambiental: Produto que causa menos danos ao meio ambiente.
Perda de Função: Perda da capacidade da enzima de catalisar reações.
pH “Amortecido”: pH mantido estável por um sistema tampão.
pH Extremo: pH muito ácido ou muito alcalino.
Precipitação da Proteína Enzimática: Formação de um sólido insolúvel da enzima.
Presença de Íons Metálicos Específicos: Existência de certos íons metálicos que podem afetar a enzima.
Proliferação Microbiana: Rápido crescimento de microrganismos.
Proteases Neutras: Enzimas que quebram proteínas e atuam melhor em pH neutro.
Proteínas: Moléculas complexas formadas por aminoácidos, incluindo as enzimas.
Resíduos Presentes nas Superfícies: Sujeira e outras substâncias nas superfícies a serem limpas.
Sais Insolúveis: Compostos que não se dissolvem em água.
Sistemas Conservantes Compatíveis: Conservantes que não inativam as enzimas.
Sistemas Tamponantes Eficazes: Misturas de substâncias que mantêm o pH estável.
Sítio Ativo: Região da enzima onde o substrato se liga e a catálise ocorre.
Sódio Benzoato: Conservante eficaz em pH ácido.
Solubilidade Enzimática: Capacidade da enzima de se dissolver na formulação.
Subtilisina: Tipo de protease neutra.
Superfícies a Serem Limpas: Materiais que precisam ser limpos.
Susceptíveis à Perda de Função: Facilmente perdem sua capacidade de atuar.
Tensoativos: Substâncias que reduzem a tensão superficial da água, auxiliando na limpeza.
Utilização: Uso do produto pelo consumidor.
Variações de pH: Mudanças nos níveis de acidez ou alcalinidade.
Variações na Própria Formulação: Alterações na composição do produto ao longo do tempo.
Vida Útil Prolongada: Tempo durante o qual o produto permanece eficaz.